quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Neurologista alerta sobre o risco de derrames no verão

No verão, com as altíssimas temperaturas e o maior consumo de bebidas alcoólicas e comidas potencializam ainda mais o risco de Acidentes Vasculares Cerebrais (AVCs), os derrames. Doenças do aparelho circulatório, como esta, são disparadas a principal causa das mortes ocorridas em Blumenau, segundo banco de dados do Instituto de Pesquisas Sociais da Furb. Em 12 anos, fizeram 5.224 vítimas, o equivalente a 30% do total de óbitos entre 1996 e 2008. Só em 2004, no ápice, foram 502 mortes. Confira entrevista com o neurologista do Hospital Santa Isabel e diretor técnico do Prontoatendimento da Unimed no Bairro Vila Nova, Walmor Roque Teixeira.

Jornal de Santa Catarina - Por que o verão aumenta as chances de derrame?
Walmor Roque Teixeira -
Isso depende muito do tipo de derrame, que pode ser hemorrágico (por ruptura de vasos) ou esquêmico (por obstrução de vasos). Eles têm a ver com hipertensão arterial, esse é o maior fator de risco. Durante o verão, com temperaturas elevadas, você tem alteração arterial e as pessoas abusam mais de bebidas de álcool e de comidas, o que potencializa o risco de um derrame. Mas os fatores de risco são o que atuam no dia a dia, ao longo do tempo. O fator sazonal, como a temperatura, é apenas secundário. Ninguém vai ter um AVC (Acidente Vascular Cerebral) se não tiver condições prévias. Há pessoas, por exemplo, que têm derrame durante o sono, apesar de ser quando a pressão baixa.

Santa - O que leva a pessoa a entrar no grupo de risco de derrames?
Walmor Roque -
Primeiro é a idade. É muito mais comum acontecer com pessoas de maior idade. Outro fator é a própria genética. Se o paciente tem histórico de doenças cardiovasculares, ele tem mais risco de ter também. Agora, a grande maioria pode ser modificada. Um exemplo é a hipertensão arterial. Se a pessoa controla bem, diminui bastante o risco. A própria obesidade, o colesterol elevado, o sedentarismo. Esses fatores associam ao risco. Geralmente quando a pessoa é obesa, é sedentária e normalmente tem mais tendência de ter alterações da gordura do sangue e mais frequentemente ser hipertenso. O diabetes é o segundo maior fator de risco porque produz alterações que vão obstruindo as artérias ao longo do tempo.

Santa - Além de combater esses hábitos que levam ao risco, é possível prevenir o derrame com um exame?
Walmor Roque -
Existe um certo exagero nisso, até porque você pode fazer um check up hoje, estar tudo normal, e amanhã ou depois você estar doente. Você tem é que se preocupar com o contexto, com os hábitos desde a infância. É claro que quando chega uma certa idade você tem de fazer exames. Você tem de cultivar bons hábitos desde jovem. Não adianta correr atrás do prejuízo depois que se tem um infarto. Tem que ter boa alimentação, manter o peso. Um homem com a barriga do tamanho da de uma grávida não pode imaginar que aquilo está sendo depositado só no abdômen. Está sendo depositado em todas as artérias. Não é um exame que vai diagnosticar, é só se olhar no espelho para ver que aquela pessoa é uma bomba relógio.

Santa - Então os magros não correm o risco de ter uma doença cardiovascular? Walmor Roque - Posso ser magro e me cuidar, mas ter pressão alta, daí tem que tratar. Nos exames você pode ver periodicamente os níveis de colesterol, o açúcar do sangue, em determinadas idades fazer check ups cardiológicos. O certo é cuidar do corpo desde jovem. Às vezes eu vejo artistas de televisão dando declarações que são chocólatras (viciados em chocolate), como se isso fosse uma coisa charmosa. Mas não é para se orgulhar. Isso cria um conceito errôneo, de que consumir algo em excesso é bom.

Santa - O derrame dá sinais?
Walmor Roque -
Dá sim. O cérebro é cheio de funções. Qualquer coisa que altere alguma função do cérebro tem de ser visto, principalmente os sinais motores. Como uma paralisia momentânea no braço, uma dormência, por 15 minutos. A pessoa sacode o braço, passou, e acha que não foi nada. Ou então ficou com dificuldade pra falar ou com a visão embaçada por um tempo. Tudo aquilo que compromete alguma função do cérebro tem de ser visto. A maioria dos exames dá esses sinais. Nesse caso, é preciso consultar um médico o mais rápido possível.

Santa - A pessoa tem um derrame. Dá tempo de alguém pedir socorro ou as lesões são irreversíveis?
Walmor Roque -
Tudo depende da intensidade desse derrame. Existem pessoas que obstruem uma artéria grande, que leva sangue para o cérebro e fica totalmente paralisado desde o início. Mas uma grande proporção de pacientes é mais leve. Em ambos os casos ele deve ser levado a um prontossocorro capacitado o mais rápido possível. Se a pessoa for abordada nas três primeiras horas existem recursos para desobstruir essa própria artéria. São medicamentos chamados de trombolíticos, que diluem esses coágulos, no caso do AVC por desobstrução da artéria, o esquêmico. Isso é endovenoso ou mesmo por dentro da própria artéria por cateterismo, como é feito no Hospital Santa Isabel, onde trabalho. Até mesmo a família pode levar a pessoa ao hospital. A grande maioria não tem acesso ao medicamento porque não chega em tempo hábil ao pronto-socorro do que por contraindicação, como ocorre em alguns casos.

Santa - Que tipo de lesões pode se evitar com este medicamento?
Walmor Roque -
No caso dos por trombose, é um fenômeno que dá pra comparar com o que ocorria com os antigos canos de ferro, agora substituídos pelos de PVC. Era muito comum você ver aquele cano cheio de ferrugem dentro. É o que acontece dentro das artérias. Ele vai ocorrendo dentro das artérias até obstruir. Por isso é preciso ser rápido, para evitar a lesão definitiva. A medida que vai passando o tempo, as células vão morrendo. Quanto mais rápido eu atuar eu evito a morte celular. Daí pode ser menor o déficit ou nenhum. Aquele remédio dissolve o coágulo e abre a passagem para o sangue. Se não ocorre por exemplo, a paralisia.

Santa - Existe um tratamento posterior ao prontoatendimento?
Walmor Roque -
Uma vez instalado, existe uma gama de situações que utilizamos para recuperar o paciente. Deve fazer fisioterapia desde o início. No caso de instalada uma rigidez no braço, é possível usar medicamento, o botox, que é usado no tratamento de rugas mas foi originalmente desenvolvido para uso da neurologia. É um tratamento intensivo. Uma grande proporção se recupera bem.